Proponho um boicote. Mas convém explicar-me e preparar o ambiente antes de trazer sugestões mais radicais. Então comecemos de novo.
Quem já viu essa cena? Ao comando do maestro, a música toca forte, em tom emotivo. Vindas de todos os lados, bandeiras invadem o ambiente. Suas cores e balanço hipnotizam os olhares até que, no clímax, a voz declara no microfone: “Está aberta a LXXIV Conferência Missionária da 9ª Igreja Jesus Volta Logo por Favor de Pindorama*”.
Os detalhes e ênfases variam, mas o acontecimento é comum em muitas igrejas, indicação de um razoável interesse nas chamadas “missões”. Buscam então trazer um ou outro “herói” dos rincões transculturais para que nos contem como é a vida a serviço de Deus lá, nos confins do cafundó.... Tudo bem que alguns não vêm de “confins” nem do cafundó....
Voltando à idéia inicial. Proponho que na próxima conferência missionária de sua igreja ou de alguma que você conheça (vá lá, faça a sua parte...) seja proibido convidar qualquer missionário transcultural. Aliás, amplio a proposição e sugiro que não se convide qualquer outra pessoa de fora da comunidade onde você está.
Quem daria as palestras e seminários? Exemplos: o sapateiro da comunidade dirá como é consertar sapatos para a glória de Deus. O empresário será convidado a proferir uma palestra sobre “ética nos négocios: preços e salários justos”. A dona-de-casa (ou dono-de-casa, sejamos sensíveis no tema de gênero) dará um workshop sobre “gerenciamento múltiplo radical”, acerca de como administrar diversas vocações, demandas, jornadas de trabalho, junto ao módulo extra de “como educar seus filhos, com todo o tempo que lhe resta, para os desafios de nosso mundo globalizado, multicultural e relativista".
As opções são infindáveis. Convido-o ao exercício. Uma artista plástica, "a estética do Reino". O contador, "administração tributária eficaz e íntegra". A professora, "a arte de educar e preparar para a vida".
Para alguns seria difícil... O especulador na bolsa de valores, ou o advogado... (desculpe-me, tentei mesmo resistir à tentação da provocação...). Mas talvez bem aí nos casos considerados “difíceis”, a necessidade e o potencial de novos e incríveis caminhos poderão levar a comunidade a novos níveis de aprendizado e obediência ao Senhor.
Nossa ausência, ao menos por um ano, dos que somos “missionários transculturais” e de qualquer outro convidado de fora, poderia ser uma fantástica contribuição à melhor compreensão e vivência da missão da igreja.
Aliás, prefiro o termo “missão” ao muito usado “missões”. Geralmente, esse último refere-se aos “transculturais”. Mas um termo só, “missão”, deveria ser suficiente para falar da vocação da igreja no mundo, aqui, ali e acolá. A geografia seria um “detalhe”. Claro que um “detalhe” para o qual o indivíduo teria que preparar-se adequadamente. Mas a missão mesmo seria de todos, em todo lugar, em um importante resgate do chamado para todos os cristãos, e não supostamente para uma certa “classe” entre eles.
Tudo bem, no final você pode me responder: “Nem pensava mesmo em lhe convidar... metido...”. E terei de admitir que o título do artigo levanta a bola para que você a corte. Tudo bem, faça o seguinte: no próximo ano você me convida para dar um seminário, junto com o advogado...
* Pindorama é o nome de um bairro de Belo Horizonte, de um município de São Paulo e de um filme do Jabor. Significa terra das ávores altas ou terra das palmeiras e de acordo com a Wikipédia seria o nome indígena por excelência para designar o Brasil.
Foto: © Stop
Upload feito originalmente por ScooterVagabond
2 comentários:
muito boa a sua sugestão. Quem sabe assim deixaremos de lado os heróis (que devem ser admirados, mas nem sempre imitados)e descobriremos que cada um de nós é chamado para servir com os seus dons no reino de Deus.
pois é, querida Heloisa, esse é o tipo de confusão que ainda vejo muito por aí, quando nos esquecemos que cada um de nós é chamado a servir no Reino, em qualquer lugar, em todo lugar, das mais variadas maneiras e profissões.
Abraço forte!
Postar um comentário