11 janeiro 2008

Antes de Lausanne



(Pacto de Lausanne – Parte 5)*

Podemos também pensar mais especificamente no Brasil, apontando para a reflexão teológica que indicava o caminho do engajamento social, que ocorria desde os tempos de atuação, por exemplo, da Confederação Evangélica do Brasil (CEB), na década de 50.

Nesse contexto surge a criação de um grupo de trabalho, que foi o Setor de Responsabilidade Social da Igreja. A CEB convocou, naquele decênio, uma série de consultas sobre a relação entre igreja e sociedade, culminando com a que ficou conhecida como a Conferência do Nordeste, em 1962, tendo como tema principal “Cristo e o processo revolucionário brasileiro”.

É bem interessante observar alguns dos sub-temas abordados nessa conferência (3):

• A Igreja e a Responsabilidade Social (Pr. Ernst Schileper)
• Cristo e o Processo Revolucionário Brasileiro (Rev. Almir dos Santos)
• Os Profetas em Épocas de Transformações Políticas e Sociais (Rev. Joaquim Beato)
• A Revolução do Reino de Deus (Rev. João Dias de Araújo)
• O Artista – Servo dos que Sofrem (Prof. Gilberto Freire)
• O Nordeste no Processo Brasileiro (Celso Furtado)
• Mudanças Sociais da História Contemporânea (Prof. Paulo Singer)
• Resistência à Mudança Social do Brasil (Prof. Juarez Rubem Brandão Lopes)
• A Missão Total da Igreja numa Sociedade em Crise (Bispo Edmundo Knox Sherril)
• Cristo – A Única Solução para os Problemas do Brasil (Rev. Sebastião Gomes Moreira)

Pode-se dizer que essas abordagens iam mesmo além de Lausanne, inspirando a gestação da depois nomeada teologia da libertação.

Se Lausanne então não foi novidade, em que sentido seu pacto se tornou um marco importante? Creio que da maneira em que ele apontou para a possibilidade de, dentro de um contexto de bases de fé consideradas evangélicas, encontrar-se uma referência sólida e bem fundamentada acerca da importância da atuação da igreja no mundo.

E essa se tornou então uma referência importante para aquele setor da igreja evangélica que não se identifica nem com o fundamentalismo, nem com uma teologia considerada mais liberal.

Não digo isso para reforçar demarcações facciosas dentro do corpo de Cristo. Mas o digo reconhecendo que há esferas de influência e de formação de opinião. E o Pacto de Lausanne inseriu-se em um contexto onde pôde lançar bases importantes para a atuação missionária evangélica séria, engajada e comprometida com o que se convencionou chamar de teologia da missão integral.

Veja logo abaixo, por exemplo, o parágrafo 5 do Pacto de Lausanne, concernente à ‘Responsabilidade Social Cristã’, e avalie como boa parte da igreja evangélica brasileira ainda precisa refletir sobre as implicações do que aí é colocado, de maneira a permitir uma revisão de nossa agenda de missão:

“Afirmamos que Deus é o Criador e o Juiz de todos os homens. Portanto, devemos partilhar o seu interesse pela justiça e pela reconciliação em toda a sociedade humana, e pela libertação dos homens de toda forma de opressão. Sendo o ser humano feito à imagem de Deus, toda pessoa, sem distinção de raça, religião, cor, cultura, classe social, sexo ou idade, possui uma dignidade intrínseca em razão da qual deve ser respeitada e servida, e não explorada. Aqui também nos arrependemos de nossa negligência e de termos, às vezes, considerado a evangelização e a ação social mutuamente incompatíveis. Embora a reconciliação do homem com o homem não seja reconciliação com Deus, nem a ação social evangelização, nem a libertação política salvação, afirmamos que a evangelização e o envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão. Ambos são necessárias expressões de nossas doutrinas acerca de Deus e do homem, do nosso amor para com o próximo e da nossa obediência a Jesus Cristo. A mensagem da salvação implica também uma mensagem de juízo sobre toda forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam. Quando alguém recebe a Cristo, nasce de novo no seu reino e, conseqüentemente, deve buscar não somente manifestar como também divulgar a sua justiça em meio a um mundo ímpio. A salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando na totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais. A fé sem obras é morta”.(4)

* parte 5 da reprodução do prefácio que escrevi para a série Lausanne 30 anos, volume 1, John Stott comenta o pacto de Lausanne, ABU e Visão Mundial, 2003.

3 Palestras citadas por QUEIROZ, Carlos Pinheiro. Eles herdarão a terra. Curitiba, Encontro, 1998, p. 116.
4 In: Evangelização e Responsabilidade Social. São Paulo, ABU e Visão Mundial, 1983, p. 16.


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