23 abril 2009

O padre e nosso pecado




– Você, sabe, Zé, que a Uruguai muitas vezes lhe chamam Paraguai...
– Sim.
– Pois é...
– E...
– Já pensou se nosso presidente fosse aquele padre?
– Ô, Mané, você não está querendo julgar o homem, está?
– Julgar? Quem sou eu? Talvez invejar...
– Opa, deixa a Menê saber disso.
– Não, deixa minha mulher fora disso. Escapou, só isso. Na verdade não queria nem morto estar metido nesse rolo. Mas fico pensando, Zé.
– Em quê? Nos pecados do homem?
– Mais ou menos. Fico matutando sobre como ele pecou.
– Ah, agora mesmo é que eu falo com a Menê. Está é fantasiando em cima das aventuras do dito cujo.
– Não, não é isso, Zé.
– Então, que é?
– Sei lá, fico aqui me perguntando, e se ele tivesse usado aquilo?
– Aquilo o quê?
– Ora, o negócio, o preservativo.
Zé balançou seu corpanzil, apertou seus olhos, hesitou por um momento, mas atirou de volta:
– Mas isso é pecado, Mané.
– E aquilo outro, ou as outras, sei lá, tudo isso não é também?
– Sim, mas... talvez ele e inclusive elas, não pensassem assim. Era amor, e amor não pode ser pecado. Bem, não estou bem certo, e você nunca vai contar isso pra Astrô, deixa minha mulher fora disso. Mas se supormos que eles pensavam que o que faziam era algo sublime, até tem um, digamos, fruto, com o nome do saudoso papa. É certo que para eles era algo mais elevado, mais nobre. Colocar essa coisa de camisinha aí no meio seria pecado e ponto.
Foi a vez de Mané balançar a cabeça, visivelmente contrariado.
– Ainda não entendo as divisões que a gente faz sobre o que é e o que não é pecado... São essas nossas contradições e incoerências. Tem razão aquele salmista ou profeta, nem me lembro mais, que diz que o nosso tal coração é muito enganoso. A gente se engana, Zé, pra fazer o que no fundo sei que está mal. Acho mesmo que a gente passa a acreditar que nem é algo tão ruim assim, ou até mesmo reconstruímos, recontamos a história no nosso coração de modo que acho que é justificado, nobre, ou que eu não tinha outra alternativa se não esse caminho...
– Que puseram nesse seu mate, Mané?
– Nada, nada...
...
– Zé!
– Quê, Mané? Já quer voltar a falar do padre?
– Não! Faz tempo que nem penso mais nele. Estou pensando em mim...
– E...
– Sabe, Zé, você me faz um favor?
– Diga!
– No dia em que eu estiver fazendo algo achando que estou tudo beleza, quando na verdade eu estiver metendo o pé na... você sabe...
– Na lama.
– Isso, pode ser, na lama. Você me dá uma mão?
– Como?
– Bom, talvez não me deixando só. Pode, e deve, me perguntar, provocar, questionar, puxar meu tapete, não deixe eu me enganar!
– Hmmm... Será que funciona?
– Na verdade, não sei, mas se é para vigiar e cuidar, creio que com dois será melhor que com um sozinho.
– Certo... E se for uns vinte?
– Embora, Zé!
...

Foto: ©
Upload feito originalmente por drcursor

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