Outro dia me perguntaram, “Você é de Rivera?”. A pergunta me deixou com aquele sentimento indefinido entre a decepção e a esperança.
Algumas explicações são necessárias. Um tanto óbvias, me desculpe, mas vamos a elas. Sou brasileiro. Vivo no Uruguai, em sua capital, Montevidéu. Rivera é uma cidade na fronteira com o Brasil. Muitos aí falam português ou portunhol. Ser de Rivera poderia significar ser um uruguaio, mas um que tem esse forte sotaque da fronteira.
Não tenho ainda muita quilometragem uruguaia. No momento, 1 ano, 7 meses e 10 dias. Quase nada. Mas as ambições costumam ser grandes. Uma delas é a de querer se identificar com a gente do país que adotamos. Não é fácil, mas está aí a aspiração.
Outro dia confessei-a a um amigo uruguaio, “quero que as pessoas me confundam com um uruguaio”. Ele me olhou em silêncio, e depois disse bem sério “se for um húngaro, talvez ele imagine isso”. Amo a doce ironia uruguaia.
Nem ligo. Inclusive, como minha amada esposa não deixa que me esqueça, sou irônico, a assim renovo minha esperança. Ao menos algo estou aprendendo. É bem verdade que possa ter vindo do Brasil assim, desse jeito, mas nem me lembro bem. É sempre mais fácil ver defeitos nos outros. Eu disse defeito?! Bom, deixemos isso de lado por enquanto.
Volto a pensar nesses montões de missionários transculturais em tantas partes do mundo. Conheci vários. Leio muitas de suas cartas desde os confins distantes de suas pátrias amadas. Tem uma coisa que não aprecio nessas cartas. É claro que eu possivelmente também faça o mesmo. Mas como eu disse sobre os defeitos...
O que me incomoda é ver em muitas delas essa equação “eles” e “nós”. Os “outros”, os “nativos”, tão diferentes e tão indecifráveis. Às vezes isso se revela mais claramente. Outras, sutilmente. É a revelação de um detalhe mais pitoresco, a afirmação de um grande obstáculo ou desafio “nessas terras”, ou mesmo um pedido de oração para que Deus faça algo entre “eles”. Ou seja, é fácil perceber que se trata de um estrangeiro em terras alheias.
Matutei sobre o tema, confesso que também sou pecador, mas resolvi adicionar uma ambição à minha lista. Trata-se de imaginar que, se alguém que não me conhece venha a ler uma das cartas que envio do “campo missionário”, não consiga identificar de onde sou, imaginando que eu seja um obreiro qualquer trabalhando entre tantos outros na seara em terras uruguaias.
Cometo a ousadia de sugerir esse saudável exercício para colegas missionárias e missionários transculturais. Ainda que não mudemos a realidade de que somos de onde somos, e creio que esse é um grande benefício do trabalho em equipes multiculturais, ganharemos todos com o esforço sincero de identificação e integração nas culturas onde servimos.
Por aqui sigo com minha aspiração. Estou louco para me encontrar com aquele húngaro e ver o que ele me dirá.
Foto: © El Salvo
Upload feito originalmente por Libertinus
2 comentários:
nos vemos a la brevedad
les dejé a vos a Rut y a las chicas un regalo musical en mi blog.
:)
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