19 fevereiro 2013

A culpa é da internet?


the ART of Holding Hands
Upload feito originalmente por ajpscs
A maioria dos diretores de companhias que oferecem serviços para encontros e possíveis namoros através da internet reconhecem que o aumento da oferta desse tipo de ferramenta certamente virá acompanhada de uma diminuição do compromisso nas relações entre casais. Um diretor de um serviço baseado no Reino Unido entrevistado pela revista “The Atlantic” de fevereiro, afirma que “o futuro verá melhores relacionamentos, mas também mais divórcios”. Alguns desses diretores afirmam inclusive que ao colocarem pessoas interessantes em contato umas com as outras, essa “oferta” fará com que o casamento se torne obsoleto.

Outros sugerem que muitas pessoas se inclinariam a romper relacionamentos atuais influenciadas pela noção de que há literalmente um mundo de oportunidades e alternativas lá fora. A comunicação e a conexão com tanta gente de tantos lugares levaria a uma diminuição do esforço e do compromisso em direção a uniões mais duradouras.

De todos os executivos envolvidos com esse tipo de serviço na internet entrevistados para um livro lançado recentemente1, somente um discordou da visão de que esse empreendimento levaria a uma diminuição dos compromissos e a um aumento dos divórcios. Para esse, um serviço de namoros online não muda o comportamento de cada indivíduo, os seus interesses, se é um tipo que só busca relações fortuitas ou se busca uma relação duradoura. “Encontrar o seu par pela Internet é um serviço que nada mais faz do que remover uma barreira para que esse encontro suceda”. O resto teria a ver com a personalidade e as escolhas de cada um, e isso independe do serviço brindado por sua companhia.

Fiquei pensando nessa única voz discordante da ideia de que os serviços de encontros on line seriam os grandes vilões da história. Sei que possivelmente sua real intenção seja apenas a de proteger a reputação de seu negócio, numa jogada defensiva. Mas ainda que sua preocupação seja somente monetária, pensemos por um momento se ele não teria razão em sugerir que cada um é responsável pelo que faz, sejam quais forem as circunstâncias.

“Conheci tanta gente interessante lá!” E esse “lá” pode ser uma viagem, um curso, um novo ambiente de trabalho, ou os famigerados serviços que arranjam encontros pela rede. “Só depois de 20 anos de casado é que vim a descobrir a paixão de minha vida!” Sim, é bastante possível que quanto mais o tempo passe, mais gente interessante você venha a conhecer. Mas, sob todos os aspectos, a vida é feita de decisões que você toma a cada dia. Podem ser pequenas ou grandes, mas desconfio que justamente esses detalhes das escolhas diárias, aparentemente sem tanta importância, os que mais diferença trarão ao longo prazo, na minha vida ou em minha relação a dois.

Ou seja, eu não posso, com o risco de ser profundamente desonesto, transferir a culpa para situações externas do contexto. Sabe aquela manchete de jornal: “Chuva mata cinco pessoas em um acidente na Dutra”? Depois, ao ler a reportagem, você descobre que a precipitação pluviométrica estava longe de ser uma psicopata assassina em série. Ainda que forte, a chuva muitas vezes é somente o contexto em que um motorista imprudente conduz acima da velocidade de segurança para aquelas condições. Sua imprudência os matou, não a chuva.

Faz já um tempo que li no "El País"2 uma reportagem sobre a suposta “descoberta” dos “genes do adultério”. Um certo alelo 334 levaria a uma propensão à busca contínua por novos parceiros sexuais. “Desculpe aí, querida, foram os meus genes”. Varões, tremei (ou alegrem-se, dependendo de sua disposição moral e espiritual), pois dois homens em cada cinco teriam o gene ou a variante do alelo que os levaria à infidelidade sexual e à poligamia. Menos mal que uma pesquisadora entrevistada para a mesma matéria tenha saído para aclarar que o tal gene não seria em si um argumento sólido para justificar a infidelidade: “Sabendo que há pontos fracos em nosso sistema biológico, isso proporciona ao menos a possibilidade de buscar ajuda para superá-los. Um homem que tem esse gene em seu cérebro pode manejar ou utilizar seu conhecimento e caráter para fazer-lhe frente e resistir a essa inquietação que faz tremer o matrimônio ou a relação do casal.” Também acrescentou: “O alelo 334 pode ser relativamente dominado, é como o caso do alcoólatra que se casa e se controla ou cura o seu vício”.

Voltemos ao tema dos serviços de namoro online e os divórcios que supostamente crescem por sua causa. Não me coloco em posição para julgar a ninguém que tenha passado pelas tragédias da infidelidade e do divórcio. Não as desejo para ninguém e busco ser empático e apoio àqueles que sofreram (ou sofrem!) por conta delas. Tampouco minha intenção aqui é falar mal dos serviços de busca de um par pela Internet (tenho bons amigos que aí encontraram o seu cônjuge), nem é a de ser um ludita que desmereça o potencial para o bem das redes sociais ou de outras tecnologias. É importante entender bem os desafios de cada época e contexto, e não sermos ingênuos para enfrentá-los de forma correta. Também não devo recusar-me a crescer e a amadurecer. Antes o alvo é ser responsável, reconhecer meus limites e buscar ajuda quando necessário. Ou seja, sempre. Não dá para viver sem mentores, amigos e referentes.

Ouvi recentemente que o problema das redes sociais ou de outras tecnologias é que elas criam oportunidades que antes não existiam. Com mais possibilidades, pecariam mais. Ora, se essa lógica estiver certa e se eu não peco só “porque não tive oportunidade”, sou o mais infeliz e medíocre dos pecadores. Porque nesse caso meu ser já estaria tomado por essa covardia vil e débil que se esconde detrás de uma aparente capa de santidade. Deus me livre do momento em que essas “oportunidades” supostamente “aparecerem” sem que eu busque estar preparado.

Minha oração na verdade deveria ser: “Senhor, tem misericórdia de mim, porque o pecado não está lá fora, na multidão de oportunidades e de contextos ameaçadores, mas está bem aqui, dentro de mim. Sou pecador, e por isso preciso do único Santo, o Senhor. Débil sou, mas em ti forte serei.” Não serão Facebook, serviços de encontros on line ou genes engraçadinhos que irão ocupar o protagonismo que cabe somente a um pecador que busca aquele que, levando-me pela mão, pode salvar-me e conduzir-me pelo bom caminho. Cuidado, que essa é uma decisão para cada dia.

Notas:
1. Dan Slater, Love in the Time of Algorithms: What Technology Does to Meeting and Mating, Penguin Group, 2013.
2. Hallaron el gen de la infidelidad masculina, 7 de setembro 2008, El País, Uruguay.

28 janeiro 2013

Dez em vinte


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Upload feito originalmente por jrorci
Compartilho aqui algumas lições aprendidas nos vinte anos de ministério estudantil(1) completados no início desse ano. Não foi rápido nem fácil aprendê-las. Mas espero que esse breve resumo possa ser útil aos que talvez estejam iniciando uma vida de serviço ao Senhor:

1. É preciso ter mentores. Sempre devemos ter pessoas de referência que nos ajudem no caminho. É essencial prestar contas. Ser pastoreado e cuidado são requisitos obrigatórios para quem quer pastorear e cuidar.

2. É preciso trabalhar em equipe. O que é guiado por estrelismo não gera um ministério sadio; pelo contrário, alimenta a vaidade. Necessito de um ambiente de equipe para trabalhar. E quanto mais capacitados forem os membros de minha equipe, melhor. Ganho mais quando me cerco de pessoas mais inteligentes e capazes do que eu. Temê-las seria minha fraqueza e uma receita para a mediocridade.

3. É preciso ter amigos no caminho. Relações no ministério não devem ser apenas relações formais e profissionais. Dou o melhor de mim quando tenho ao meu lado pessoas em quem confio e que confiam em mim. Afeto, amizade, transparência e cuidado mútuo rimam com um ministério frutífero e saudável.

4. Devo tomar cuidado com os elogios que me fazem. Podem ser reais, merecidos ou exagerados. Não importa o que de fato são. Se acredito em todas as coisas boas que dizem a meu respeito, e se me acomodo na ilusão dessas projeções, a tentação será grande, e o abismo que o segue maior ainda.

5. As críticas servem para crescer. Devo prestar atenção em todas as críticas que me fazem. Elas me ajudam a crescer, a manter um espírito humilde e a cultivar uma atitude disposta para a revisão e correção.

6. As críticas não são o foco principal de minha motivação. Não devo prestar atenção em todas as críticas que me fazem. Se fico obcecado com elas, ou se procuro atender a agenda de todos, é quase certo que perderei o foco principal daquilo a que sou chamado para fazer.

7. Consenso é sempre melhor que votação. Quando há dissensão, não há melhor remédio do que o diálogo e a construção comunitária de um consenso. É melhor conversar, orar, esperar, voltar a dialogar do que precipitar-se e provocar uma divisão e feridas difíceis de serem curadas.

8. Se errar é comum, reconhecer o erro também deveria sê-lo. Não só imagine que você talvez possa errar. Você vai errar! Mas o que fazemos após o erro é sempre a parte mais importante. O melhor é sempre admitir o erro, assumir responsabilidade e estar disposto a voltar atrás ou a reparar o erro, se estiver ao seu alcance.

9. Trabalhar é bom, mas não com o sacrifício da família. Se você não tem prazer algum no seu trabalho, avalie se é possível redirecionar o foco e o rumo daquilo que você faz. Mas se você ama o que faz, ou é pressionado no trabalho com demandas extras e pouco realistas, nessas duas situações há riscos. Porque em ambas é necessário cuidar-se para não se dedicar ao trabalho de tal modo que sacrifique o tesouro mais precioso que Deus lhe deu: sua família e seus amigos.

10. Aprender e continuar crescendo são metas para toda a vida. Pense sempre em como você pode continuar realizando sua vocação de maneira melhor do que a realiza hoje. Prepare-se, busque novos desafios, aperfeiçoe os talentos que você já tem e encare a aventura de buscar desenvolver novas capacidades. A acomodação o leva à morte, sendo que gratidão, humildade e iniciativa são chaves que nos abrem portas para as novas etapas da vida.

Celebro esses vinte anos buscando aplicar essas dez lições em minha vida e vocação. Espero que com sua ajuda eu possa aprender tantas outras mais para os próximos anos.

Nota
1. Felizes anos de trabalho na Aliança Bíblica Universitária (ABU), na Comunidad Bíblica Universitaria (CBU Uruguai) e na Comunidade Internacional de Estudiantes Evangélicos (CIEE/IFES).