Ainda me surpreendo, com o meu pecado e o alheio. Não deixo de notar que meu coração segue entranhado no mal, minha língua continua rápida para ferir e minhas mãos ainda são rápidas para fazer o que não devo e ágeis para se omitir onde e quando deveriam atuar.
Talvez por isso minha surpresa ao deparar-me outra vez com essa pequena frase da primeira carta João ao preparar as exposições bíblicas para o recente congresso nacional da ABU (Aliança Bíblica Universitária): “seus mandamentos não são pesados” ou, em outra tradução, “seus mandamentos não são difíceis de obedecer”*. Como assim? Eu, e aqueles estudantes universitários com quem eu me reunia para estudar a Palavra sabemos que facilmente nos enredamos no mal. E que muitas vezes só com dificuldade alcançamos seguir o bem e a justiça.
Como resolver essa equação? Devo confessar e reconhecer que minha cabeça de engenheiro segue uma lógica linear, bem diferente da lógica circular do texto da carta. João tem essa mania de dar voltas, de repetir-se, de dificultar a nossa tarefa de tentar preparar uma exposição e esboço mais lineares, concatenados e objetivos.
Minha esposa adorou saber que a lógica de 1 João é mais circular. Parece que isso tem a ver com os momentos da vida privada do casal quando já cheguei a lhe dizer algo como “não tem lógica esse seu argumento”. “É só uma lógica diferente”, dizia ela. Agora, inclusive, ela anda contente com essa aparente “base bíblica”, sugerindo de forma marota que seus argumentos seguem “uma lógica como a de João”.
Voltemos ao tema do pecado, de onde saímos. Como resolvo o dilema, esse sobre se seria fácil pecar, como minha experiência e a de muitos sugere ou se seria fácil obedecer, como sugere o apóstolo amado?
O caminho das equações, das razões e proporções me oferece uma luz. Me parece que quanto mais perto do Senhor, em íntima e cultivada relação, mais fácil é para mim obedecer. E quanto mais longe do Senhor, quanto mais distante de seu coração e de seus propósitos para mim, mais pesados serão os seus mandamentos e, por conseguinte, mais fácil será pecar.
Abro parênteses para sugerir que paremos de ver o pecado como algo que esteja fora de nós, para o qual olhamos e analisamos a partir de um ponto de vista frio, objetivo e imparcial. Nossa natureza é pecaminosa. Assim o comum e o natural são a maldade, a injustiça e a omissão que brotam de nosso coração. O ponto de partida sempre deve ser o reconhecimento de nosso estado e nossa confissão. Assim se pavimenta a rota para a santidade e a retidão.
Seja na ecologia, na economia, na sexualidade ou na devoção, peco mais fácil quando me afasto da luz e me perco nas trevas. Na escuridão eu não consigo ver a realidade ao meu redor, não sei para onde estou indo e ainda faço com que outros tropecem**. Mas quando me aproximo de Deus e de sua Palavra, seus mandamentos não pesam e a obediência me leva à paz e à justiça nas micro-relações pessoais, na relação com Deus e na vida ética do povo de Deus no mundo onde o Senhor nos colocou. Fácil pecar ou fácil obedecer? Depende de você, do que você se alimenta e por onde você anda.
Notas
* 1 João 5.3b, NVI e NTLH
** 1 João 2.10,11