28 julho 2008

Responsabilidade rima com generosidade


(Série Histórias Agronômicas - VIII)

“…as aves do céu podem abrigar-se à sua sombra” (Mc. 4:32)

O que teve seu início no cuidado, proteção e amor das mãos de quem semeou, ao fim também produz bênção para outros.

O que era pequeno teria se tornado grande e importante? Sim, mas veja bem que isso se deu através de certos critérios. E eles são o do serviço e o da adequação ao seu chamado.

Primeiro, o serviço. Se algo não servir para abençoar a outros, então para nada serve. Como tanta coisa no Reino, aquilo que se retém, se perde. Aquilo que se gasta e se investe na vida de outros, ao contrário, tem grande proveito.

Segundo, a adequação à sua proposta ou chamado. Não se pode esperar de uma hortaliça o que só um carvalho pode oferecer. Sempre é preciso revisar as expectativas para checar se elas estão em saudável perspectiva.

Concluímos essa série voltando ao interlúdio entre as parábolas agronômicas (Mc. 4:21-25), que nos revela que aprendizagem tem a ver com responsabilidade.

Que fazemos com o que aprendemos? Que
fazer com algo precioso que alguém recebe em suas mãos?

A metáfora da luz nos fala de diligência. Por isso o “se tem ouvidos para ouvir, ouça!” Se escutaram, se aprenderam, ponham em prática, assumam responsabilidade pelo aprendido, multipliquem-no.

O critério uma vez mais será o benefício de muitos. Ponham a luz em “um lugar apropriado”, para que ilumine bem, para que chegue a mais gente, para que ela sirva a um propósito útil.

Jesus conclui nos indicando que responsabilidade rima com generosidade (Mc. 4: 24-25). À primeira leitura, soam difíceis essas palavras de Jesus quanto ao princípio da reciprocidade.

Talvez aceitemos mais facilmente essa lógica quanto aos julgamentos. Se formos duros ao julgar, assim também seremos julgados. Parece razoável. E, pensando bem, também parece bem justo que a reciprocidade seja aplicada à generosidade.

Ou seja, se somos generosos ao dar e oferecer, ainda mais nos será dado. Esse recebido também será oferecido e assim sucessivamente segue o ciclo. Note que é algo distinto da sutil, ainda que terrível, distorção da “teologia da prosperidade”, onde o foco se dá na ganância de querer ganhar e acumular, algo voltado para si mesmo e seu próprio benefício.

Como todas as parábolas agronômicas nos confirmam, o foco deve ser o de produzir, multiplicar e abençoar. Quanto mais damos, mais recebemos, e é claro que isso demandará um processo de maturidade e crescimento na fé.

Assim termino o que parecia uma interminável série de pequenas reflexões sobre o capítulo mais agronômico de todos. Se algo lhe foi útil, aplique a lição. Seja generoso ao repartir, cultivar, melhorar, fazer crescer e aprofundar aquilo que apenas foi plantado. Quanto mais cabeças e mãos pensarem e trabalharem juntas, mais oportunidades a rima do título terá para funcionar.


Foto: © Sunset, upload feito originalmente por surplus-to-requirements-stan.

22 julho 2008

Nossa atitude com as coisas pequenas


(Série Histórias Agronômicas - VII)

“...é a menor semente que se planta na terra”. (Marcos 4:31b)


Quem já não passou pela experiência de ver um esforço pessoal ou uma pequena iniciativa ser minimizado ou mesmo desprezado?


E quem também já não teve atitude semelhante consigo mesmo ao desistir de algo por pensar que nunca chegaria a ser algo relevante?


Aquelas mãos que crêem e que sabem esperar são também as mesmas mãos que tomam a “menor semente” e a plantam na terra. Com esse pequeno ato e gesto, dão um enorme passo de fé.


“Uma vez plantado” (4:32a), ou seja, o ato de semear se junta ao poder latente da semente, e se transforma em uma ação conjunta de “fé” + “potência latente” para a grande obra que será realizada, exatamente graças a essa conjunção de fatores.


As mãos que “cultivam e guardam” (Gêneses 2:15) são as que, devido ao tamanho da semente, mais cuidado e proteção brindarão à pequenina. Mas também, e esse é um lindo paradoxo, mais confiança e fé nela terão quando a semearem, pois crerão no muito que daí poderá surgir.


Um diferencial importante se dá já desde o início. E esse tem a ver com a percepção do que é pequeno, da perspectiva e do olhar que cada um tem da situação. Se aplicarmos critérios “convencionais”, a semente seria algo pequeno e sem valor.


Por outro lado, uma atitude mais adequada poderia considerar o que já vem com a semente, e que muitos não vêem ou não valorizam. Reconhecer essa riqueza embutida, quase escondida, e seu potencial para crescer, produzir e multiplicar-se.


Também há algo mais além do poder da semente. Trata-se da experiência e conhecimento do semeador, que já viu o que acontece depois da semeadura, que aprendeu quando é melhor semeá-la, em que condições e de que maneira.


Esse é o conhecimento que vem da tradição e da vida. Nenhuma nova tecnologia poderá substituir a importância desse saber. Nem minimizá-lo, nem dizer que é de “pequeno” alcance.


Ao fim das contas (e da colheita), o que parece pequeno se tornará grande, mas nesse pequenino texto já não há mais espaço para pensar nos critérios para dizer se algo é pequeno ou grande.


Fica para a próxima, numa promessa latente, como a semente. Espero que você creia. Em mim? Não! Nela, na semente.

(Continua...)

Foto: © Marquicio Pagola

14 julho 2008

Fazer bem leva tempo


(Série Histórias Agronômicas - VI)


“…primeiro o talo, depois a espiga e, então, o grão cheio na espiga”. (Marcos 4: 28)


Às vezes me pergunto quando é que desejaria ver os resultados de um trabalho com o qual esteja envolvido. Minha primeira reação, e é bom que seja assim, é a de desejar vê-los rapidamente. Quero me certificar de que estou indo na direção certa, que vale a pena todo o empenho.


Entretanto, e acredito que assim o seja em uma ampla variedade de situações, demora-se até que seja possível discernir os primeiros frutos concretos de um esforço. Às vezes até me pergunto se um dia o veremos.


Essa parábola me ajuda a valorizar a importância das etapas, a reconhecer que comumente há um processo até que se possa chegar lá. Há que esperar para que o grão fique “maduro” (v. 29). Mesmo que seja difícil, é necessário aguardar o “tempo da colheita”.


Três rápidas lições. Primeira, é preciso perseverar ao longo dos processos, também levar em conta que freqüentemente são demorados, e assim não desanimar no meio do caminho (lembre-se de Eugene Peterson, para quem a perseverança é sinônimo de “longa obediência em um mesmo caminho”).


Segunda, é necessário desenvolver uma saudável capacidade de avaliar os processos, reconhecer os avanços e retrocessos, ser capaz de revisar com propriedade e sabedoria os passos e os meios pelos quais desejamos chegar aos resultados (em outro momento penso em voltar ao tema dos critérios que devemos usar em avaliações).


Terceira, a perspectiva da colheita é algo que alimenta nossa esperança. Isso acontece quando a escatologia não é usada como um escape e sim como alento e alimento na obediência prática e concreta do presente.


Como está sua disposição para perseverar sem que veja o resultado de seus esforços?


Compartilho algo que me ajuda. Espero que também lhe sirva. Busco imaginar como é que as próximas gerações de estudantes universitários se beneficiarão do trabalho que estamos desenvolvendo agora. Que tipo de ministério estudantil cristão encontrarão na universidade os estudantes que nela entrarem daqui a 5, 15 ou 30 anos? Como é que o que plantamos agora poderá lhes ser útil para que eles enfrentem com fidelidade e criatividade os desafios de seu tempo?


Pense nisso. Ficarei feliz ao ouvir suas idéias.


(Continua...)


Foto: © Yan Seiler

07 julho 2008

Quando “não saber” é uma virtude

(Série Histórias Agronômicas - V)

O poder da semente que sempre nasce e cresce é um mistério que o agricultor não entende (Mc. 4:27). Tampouco nós chegamos a entender.


Daí surge na memória o que Jesus disse acerca de Deus decidir revelar as verdades mais profundas do evangelho aos humildes de coração, ocultando-as dos supostamente mais sábios e entendidos.


Poderíamos então chegar à libertadora percepção de que o “não saber” aponta não somente para uma limitação de nossa capacidade, mas também para algo desejável para uma sã espiritualidade?


Examinemos rapidamente quando o “não saber” se tornaria uma virtude.


Um desses casos nos é revelado pela parábola da erva daninha (Mateus 13:24-30;36-43). Ela nos impede que nos coloquemos em uma posição de juízes, pois em verdade não o somos. Há somente um. Quando pensamos que “sabemos”, arriscamo-nos a arrancar a planta que cresceu da boa semente junto com a nefasta.


“Não saber” também é algo que nos ajuda a não nos afogarmos em uma tentadora necessidade de controlar os processos e os resultados, essa que acaba nos levando a uma ansiedade absurda. Evitando essa armadilha, podemos desenvolver essa confiança mais leve e descansada no Senhor.


Por fim, se pudéssemos entender tudo acerca do poder e do mistério embutido na semente que é a Palavra, poderia suceder que víssemos a nós mesmos como grandes e que percebêssemos a Deus e sua Palavra como pequenos e manipuláveis de acordo com nossos próprios interesses.


Difícil imaginar algo mais perigoso do que a religiosidade como instrumento de poder para que uma pessoa ou grupo levem a cabo suas próprias agendas.


Há muita virtude em confiar naquele poder que faz com que “a terra por si produza o grão” (v. 28).


(Continua...)


Foto: ©
Isaac Bonyuet - 2008 TrekEarth